sábado, 11 de julho de 2009

Controversias das imagens II.

O Santo Sudário enquanto imagem ( texto de vários autores) abrem novos debates.














O que é o Sudário de Turim
por Ernesto Arosio.

Um intrigante fato que, há séculos, perturba a ciência e estremece a fé das pessoas é a Síndone (outro nome pelo qual é conhecido o Sudário de Turim). Trata-se de um lençol, venerado por séculos, que desafia a ciência e a inteligência humana. Quem é o homem retratado no Sudário? O que vem a ser esta relíquia tão venerável e venerada pelos cristãos, mas também apontada como um falso histórico, uma fraude ou embuste, pelos que se recusam a admitir a sua autenticidade?
A admissão da autenticidade e antiguidade dessa relíquia, que atrai milhões de peregrinos ao longo dos séculos, para a catedral de Turim, motiva uma pergunta existencial e crucial também para o homem moderno. O homem retratado no lençol seria o Cristo dos Evangelhos? Ou seria um malfeitor justiçado pelos romanos, ou uma fraude perfeita que enganou, durante tanto tempo, e continua iludindo a credulidade de milhões de pessoas, entre os quais grandes cientistas e estudiosos?


Um lençol dobrado com a imagem das costas e frontal de Cristo.















O Santo Sudário de Turim

Negativo da imagem feita do Santo Sudário em 1931 pelo fotógrafo G. Enrie,mostra a imagem em positivo de uma pessoa
um lençol de 4,37 metros de comprimento e 1,11 metros de largura, com a figura frontal e dorsal de um homem de barba, provavelmente morto crucificado. O lençol é de linho (tecido trançado na forma de escamas de peixe) e, nas duas extremidades, a superior e a inferior, assim como no seu corpo central, tem tiras e remendos de algodão.
Fios deste lençol foram retirados, ao longo da sua história, em duas ocasiões, para exames científicos: em 1873, para examinar o tipo de linho e, em 1988, para descobrir uma possível data de sua origem, através do método de Carbono 14 (C-14). (A quantidade de C-14 dos tecidos orgânicos mortos diminui a um ritmo constante. Assim, a medição dos valores do C-14 em um objeto nos dá pistas dos anos decorridos desde a sua morte).
O lençol apresenta manchas e chamuscados, devido às chamas que o ameaçaram, quando estava guardado na capela de Chambéry, França, destruída por um incêndio em 1532. Há sinais de outros chamuscados anteriores, em datas não especificadas, cujas manchas já tinham sido documentadas, através de uma cópia pictórica elaborada antes de 1532. Na ocasião do incêndio de Chambéry, o sudário estava dobrado e conservado em um estojo de prata.
Por causa das dobraduras no lençol, existem imagens simétricas de queimaduras, e isso se justifica, uma vez que a prata do estojo se havia derretido em parte, atingindo e queimando algumas dobras do tecido e deixando penetrar a água usada para dominar o fogo que chegava até o sudário.
Após aquele incêndio, as irmãs Clarissas consertaram a peça de linho com tiras e pedaços de algodão holandês, conforme mencionamos acima. Outro incêndio aconteceu em 1997, em Turim, do qual o sudário foi salvo incólume.

O homem do sudário
A imagem da pessoa impressa no lençol, um homem deitado em posição frontal e dorsal, tem a singular característica de se apresentar como se fosse o negativo de uma fotografia. No lençol, a figura é pouco visível, quase transparente, quando olhada de perto, mas se torna mais nítida quando observada de longe. Na história do sudário, o momento que o tornou célebre e, no mesmo tempo intrigante, aconteceu em 1898, ao ser fotografado pela primeira vez. O negativo dessa primeira foto registrou o retrato em positivo de uma pessoa em tamanho natural, frente e verso.



Imagem esculpida da revelada pelo Sudário.






Secondo Pia
O registro fotográfico passou a intrigar os cientistas, que logo se alinharam em duas frentes: a dos que sustentavam, e ainda defendem, a originalidade e a autenticidade do sudário; e a dos que sempre lhe opuseram resistência, e o fazem ainda, argumentando que a peça nada mais seria do que uma admirável fraude, realizada por um pintor francês, do século 12 ou 13, na segunda parte da Idade Média. A partir dessa inesperada descoberta fotográfica, iniciou-se uma intensa polêmica sobre a origem do sudário e sobre a identidade da pessoa retratada nele.
Serviria a síndone como uma tentativa de construir um ícone devocional de Cristo com meios pictóricos? Nesse caso, o autor teria misturado até sangue verdadeiro às tintas, a fim de obter um realismo dramático. Na verdade, ele estaria utilizando um recurso bem estranho ( e desconhecido) naqueles tempos medievais. O sudário foi estudado cientificamente em Turim, em 1978, e, em 1982, com os recursos do Carbono 14, por alguns cientistas da NASA, em laboratórios italianos, em outros centros de pesquisa europeus e americanos.

Os exames do C-14 teriam demonstrado que a origem do lençol, e o conseqüente retrato humano nele impresso, não poderiam ser anteriores ao ano 1300. Esta hipótese foi seriamente questionada por alguns cientistas, baseados em fatores diversos, com maior ou menor relevância quando analisados isoladamente, mas fortemente importantes no conjunto das provas. Ressalte-se que a técnica do C-14 só pode aferir com precisão amostras que tenham até 50 mil anos de idade.
A imagem gravada no sudário não apresenta os traços característicos de pintura feita a pincel, mas parece ter sido impressa pelo contato direto do cadáver de alguém que falecera pouco tempo antes. A peça de linho mantém ainda resquícios de produtos aromáticos utilizados para a conservação de um corpo. Seria quase como uma projeção luminosa dos vários pontos, colados ao lençol, que o marcaram com uma figura. O corpo também apresenta harmonia tridimensional (comprimento, largura e altura), sem distorções ou desfigurações, algo impossível de ser captado através da reprodução pictórica.

Em resumo, a imagem mostra uma figura de tamanho natural, com dimensões proporcionais e sem distorções. Eventuais pintores tentaram reproduzir a imagem do sudário em quadros e afrescos, mas obtiveram resultados pífios, bastante grosseiros, distantes da perfeição do retrato impresso no lençol. Sem nos delongarmos em outras descrições científicas, entregamos ao leitor resultados de exames. Eles demonstraram que não existem cores artificiais no sudário; as manchas escuras são resíduos de sangue verdadeiro.
As manchas sangüíneas são compostas de óxido de ferro biológico que, a seu redor, formaram contornos de soro mais claro, como acontece nas bandagens que envolvem feridas recentes. O professor Sebastião Rodante, de Siracusa, Itália, realizou uma experiência nas catacumbas de Aprile, perto daquela cidade, em que um lençol de linho foi umedecido com aloe, gotas de sangue e suor. Depois de 26 horas, a consistência do produto assemelhava-se à consistência do sudário. Como conclusão desta primeira descrição, podemos confirmar que as manchas impressas no sudário provêm exatamente de sangue humano, revelando que a figura nele representada, coberta de hematomas e feridas, foi a de uma pessoa brutalmente assassinada.
Testemunhos e provas da antiguidade do sudário
Fragmento da Síndone com os sinais das queimaduras depois do incêndio de 1532 em Chambéry
Foi comprovado que o sudário é bem antigo e tem origem oriental. Descobriu-se, em suas superfícies, a presença de pólen (elemento masculino dos vegetais que, levado pelo vento ou pelos insetos, fecunda os ovários das plantas. Cada região geográfica tem plantas típicas que produzem o seu pólen característico).
No sudário, foram encontrados e estudados, através de um super-microscópio (com a capacidade de aumentar os grãos analisados até 36.000 vezes), 13 tipos de grãos de pólen existentes na França central; 16 do Piemonte, a região de Turim onde o sudário se encontra atualmente; 11 tipos de pólen característicos de Constantinopla; 25 de Jerusalém; 11 da região do Mar Morto e 18 da Anatólia (atual Turquia).
Isto significa que o lençol, ao longo dos séculos migrou por esses lugares. A presença de pólen no tecido confirma e reforça alguns testemunhos que se encontram nas crônicas da Igreja, ainda no primeiro milênio da era cristã, e depoimentos de bispos que viveram em várias regiões citadas. Em 348, o bispo Cirilo citara um sudário conservado na basílica construída por Constantino, a atual basílica do Santo Sepulcro, em Jerusalém. Em 525, cronistas afirmaram que o sudário estaria em Edessa-Anatólia.
Em 944, ele estaria em Constantinopla (atual Istambul), onde teria sido exposto aos fiéis, dobrado, mostrando somente o rosto impresso da pessoa. A imagem era chamada de Aqueropita, ou seja, não feita por mão de homem. Aquela imagem teria inspirado muitos pintores bizantinos, eslavos, e até foi cunhada em moedas imperiais de Bizâncio (Constantinopla), de onde teria desaparecido por um tempo. A tradição popular atribui a sua guarda aos templários, mas não há documentos que comprovem essa lenda. O sudário reaparece em 1356, na localidade de Lirey, França.
A partir dessa data, existem documentos que comprovam e acompanham, passo a passo, o seu caminho. Em 1389, o bispo Pierre d’Arcys de Troyes proíbe sua exibição pública e o antipapa Clemente VII refere-se à Santa Síndone, ou Santo Sudário, em duas cartas. Em 1453, o lençol foi comprado pelo duque Ludovico de Sabóia. Em 1532, encontrava-se na capela de Chambéry, quando foi salvo do incêndio já citado.
Em 1579, foi levado a Turim, capital do Ducado dos Sabóia e, em 1694, foi exposto na capela do Sudário, na catedral da cidade. Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), ficou escondido em um Santuário mariano, em Benevento, cidade no sul da Itália e, depois, foi reconduzido a Turim. Em 1983, a família real italiana dos Sabóia, deposta e exilada, doou o sudário ao Papa João Paulo II, que o conservou sob a custódia do arcebispo de Turim, onde se encontra atualmente.
Indagações sobre um antigo delito
As análises do sudário mostram claramente que a figura nele impressa, retratada em detalhes, é a de uma pessoa assassinada através de morte violenta, após implacável e impiedosa tortura. Os sinais do suplício e os ferimentos são muito semelhantes, quase idênticos, aos narrados nos
Evangelhos sobre a paixão e a morte de Cristo.
As feridas que marcam o cadáver foram estudadas e analisadas por especialistas em medicina legal, crentes e não crentes, também judeus, através de todos os meios modernos disponíveis, como reproduções fotográficas super-ampliadas e de alta resolução, computadores poderosos que fornecem imagens perfeitas de como o homem foi seviciado e morto. O sudário comprova a morte do supliciado por crucificação. Documentos do tempo do Império Romano atestam o mesmo tipo de pena capital, aplicada a certos condenados não-romanos.
















As sevícias
Nos ombros e ao longo do dorso do homem do sudário, seja no lado frontal, como no dorsal e nas pernas, são visíveis dezenas de pequenos ferimentos com até dois centímetros de diâmetro, às vezes emparelhados, dois a dois, como se fossem causados por pequenos ossos e chumbos. O supliciado, indefeso e imobilizado, não tinha como se defender da saraiva de golpes. Os sinais são típicos da flagelação aplicada pelos romanos aos não-romanos. O "flagellu" era um instrumento de madeira com cordas em cujas extremidades havia pequenos ossos ou metais.
Na testa toda e da nuca até a parte superior da calota craniana, aparecem pequenas feridas alinhadas, como uma coroa, provocadas por corpos pontiagudos e perfurantes (espinhos?). São ferimentos bem visíveis no negativo do sudário. Esses corpos perfurantes provocaram numerosas hemorragias, que perduraram por bastante tempo, como o demonstram as várias direções do sangue coagulado, devido às diferentes posições da cabeça do condenado. Impregnada de sangue coagulado aparece, nitidamente, a longa massa de cabelos da nuca do cadáver.
Na altura dos ombros do homem, é visível uma profunda escoriação da pele e uma contusão transversal atrás do pescoço, sinal que o condenado carregara algo pesado, amarrado aos braços abertos. A tradição romana e documentos do seu antigo Império confirmam a opção brutal da cruz como instrumento de morte. O patíbulo (o braço transversal da cruz), era amarrado aos braços e apoiado nos ombros do condenado, que devia levá-lo até o lugar do suplício. Amarrado dessa maneira, o condenado não podia abaixar os braços.
Durante o percurso, o condenado era escarnecido e flagelado e, em caso de queda, não tinha como atenuá-la; então caía, batendo em cheio os joelhos e a face, sem possibilidade de se proteger com os braços. O homem do sudário apresenta hematomas no rosto, tem o nariz quebrado e inchaços que lhe desfiguram as feições. No sudário, as manchas que representam os joelhos, a face e os pés, conservam resquícios de terra misturada ao sangue. Os joelhos apresentam ferimentos e lacerações típicas de quedas.
A lei romana aplicava a morte por crucificação de duas maneiras: o condenado poderia ser pregado à cruz ou nela amarrado com cordas. Contrariando a iconografia cristã, que representa Cristo carregando a cruz inteira, a haste vertical da cruz ficava permanentemente plantada no lugar do suplício final, e servia como cruel e severa advertência aos malfeitores. Quando o condenado conseguia chegar vivo ao lugar da morte, amarrado à trave horizontal, era estendido no chão para ser firmemente atado ao patíbulo com cordas ou pregos. A seguir, era erguido e aprumado à haste vertical, na qual se encaixava a trave horizontal.
Seus pés seriam também fixados à madeira com cordas ou pregos. Bem visível no lençol, nota-se um ferimento na mão esquerda do cadáver, com conseqüente escorrimento de sangue na altura do pulso, o que contraria a maioria das pinturas que piedosamente retratam o Cristo crucificado, tendo pregos na palma das mãos. A palma da mão não tem a consistência óssea minimamente necessária para amparar um corpo humano, ainda mais quando ele convulsiona na lenta e dolorida agonia.
No homem do sudário, mais um pormenor anatômico confirma a crucificação por pregos: os polegares estão dobrados no interior da palma das mãos, como sinal da contração dos nervos rasgados pelos pregos. Os pregos usados em crucificações eram os típicos pregos de carpintaria daquele tempo, quadrados, compridos, feitos um-a-um, que provocavam um ferimento quadrado. Este pormenor foi também constatado naquele corpo, em recente e acurada análise do lençol. Em Giva’t Hamivtar, lugarejo próximo de Jerusalém, foi descoberto o esqueleto de um homem que fora crucificado provavelmente no ano 78 da nossa era, durante a destruição de Jerusalém.
A vítima ainda conserva um prego cravado nos ossos do calcanhar, o que evidencia, portanto, o sádico uso de tais objetos contundentes nas crucificações. O homem do sudário tem os pés perfurados e enrijecidos, voltados para o interior. Há manchas de sangue no dorso e na planta dos pés. O pormenor, confirmado por foto ultravioleta, confirma e revela o ferimento causado por prego nos pés do crucificado. Os médicos legistas ainda constataram que o sangue escorrido dos braços e das pernas tomou diferentes direções, evidenciando que o condenado tentou alguns movimentos e espasmos durante sua horrenda agonia.
De fato, a posição em que se encontrava o condenado, pendurado na cruz, provocava-lhe dificuldades respiratórias, devido à dilatação pulmonar. A vítima tentava inutilmente apoiar-se sobre os pés, a fim de aliviar a tensão dolorida, mas os pregos imobilizavam-no. Legistas que analisaram o sudário afirmam que a vítima morreu por asfixia, causada pela falta de movimentos torácicos e incapacidade de inspiração.
Para acelerar a morte do condenado, os soldados romanos quebravam-lhe as pernas, impedindo ainda mais os movimentos de respiração. A narração dos Evangelhos confirma esta prática (Cf. Jo 19, 31-32). Porém, o homem do sudário não apresenta fraturas nas pernas, mas mostra um ferimento no hemitórax direito, provocado por um objeto pontiagudo de 4 centímetros de largura. Dentro da lesão foram encontrados resquícios de sangue e de soro aquoso. (Cf. Jo 19, 33s)
O Sudário é falso?
O sudário é um documento importante para comprovar algumas realidades descritas nos Evangelhos, que poderiam até levar a fundir o homem do sudário com a pessoa de Cristo histórico, cuja narração da paixão e morte se encontra nos Evangelhos. Para derrubar essa aproximação ou identificação entre ambos, tentativas de interpretação e vários estudos quiseram demonstrar que o sudário não passa de fraude. Chegou-se a afirmar que o sudário foi pintado por um exímio pintor medieval, que teria inclusive misturado sangue verdadeiro às tintas empregadas na obra. Apresentamos a você, leitor, algumas das teorias propostas a negar a historicidade do lençol.
Carlo Papini, jurista italiano, procura negar a autenticidade do sudário, baseado em uma razão de natureza cultural. Os judeus – ele escreve – consideravam impuros os objetos relacionados a falecidos. Por isso, evitavam tocar, manusear e guardar tais objetos, ainda mais às vésperas de uma festa tão importante, como a da Páscoa judaica. Ele nega, portanto, que os que acudiram ao Cristo morto pudessem conservar o lençol e outros utensílios utilizados na crucificação. Seria pouco provável, afirma Carlo Papini, que pessoas religiosas, piedosas e obedientes às suas tradições judaicas tivessem recolhido o lençol depois da ressurreição de Cristo.
Entre os piedosos, estariam os primeiros cristãos, praticantes das leis de Moisés. Portanto, o lençol que envolveu o Cristo morto teria desaparecido. O estudioso também argumenta que não há documentos históricos, nos primeiros três séculos do cristianismo, a comprovar a existência da relíquia. Desses primeiros séculos, haveria apenas um leve aceno à relíquia no apócrifo chamado Evangelho dos Hebreus, citado por São Jerônimo. De sua existência, porém, não há nenhuma prova.
Outros, cientistas ou não, sustentam que o sudário resulta de uma experiência mal sucedida, efetivada por um artista medieval, com o cadáver de um homem. Ora, tal experiência parece-nos absurda, porque seu presumido autor deveria dispor de um cadáver de alguém, morto há poucas horas, mas que tivesse passado por todas as sevícias e pormenores relatados nos evangelhos. É impensável encontrar uma vítima nessa lastimável situação, a não ser que o próprio “artista” a tenha deixado em condições tão bestiais.
É improvável, além de macabro, que tal “obra” tenha sido fruto de um assassinato ou do vilipêndio de um cadáver. Nesse hipotético caso, o pintor deveria conhecer detalhes e particularidades anatômicas (desconhecidas pela ciência de então), além de todos os documentos antigos, especialmente sobre procedimentos dos romanos a respeito da crucificação (que só seriam descobertos recentemente) e, finalmente, deveria posicionar-se diferentemente da tradição pictórica e iconográfica comum na cristandade da época (como os pregos na palma da mão e não no pulso, o carregamento da cruz inteira pelo supliciado e não apenas do patíbulo, e outros tantos que já analisamos no texto).
Para superar tais entraves, o “artista” deveria ser um gênio para rejeitar a tradicional iconografia do final da Idade Média, dominar conhecimentos para além de seu tempo e ser o precursor de novos e desconhecidos conceitos pictóricos. Além disso, ele deveria conhecer a fundo a cultura hebraica dos tempos de Cristo e o poder dos conquistadores romanos. Parece-nos impossível que um “gênio” medieval possa ter elaborado uma obra que contivesse detalhes a serem descobertos apenas recentemente, através de instrumentos sofisticados e ultramodernos, como diferentes grãos de pólen, invisíveis a olho nu e de distantes procedências, por exemplo. Ou moedinhas postas sobre os olhos do cadáver.
Dia da Santa Síndone
Em 1506, uma bula do Papa Júlio II concedia à capela do Castelo de Chambéry, na França, onde estava a Síndone, o título de Santa Capela do Santo Sudário e instituia da festa do Santo Sudário em 4 de maio, dia seguinte ao da comemoração da Santa Cruz. Desta forma intensificou-se notavelmente a veneração do Sudário.
Nesta época, a cada ano, no dia 4 de maio e na sexta-feira santa, era solenemente exposta à multidão. Hoje em dia, para preservar o Sudário, as exposições não são freqüentes e só ocorrem em anos muito especiais. A última exposição foi no ano 2000 em comemoração ao Jubileu de nascimento de Nosso Senhor.
Manuel Solé, O Sudário do Senhor




Persistem as dúvidas
"Realmente é inexplicável que um Homem tão maltratado físicamente, como aparece diante de nossos olhos o Homem do Sudário, não apresente no rosto sinais de enrugamento, de ódio, de ira impotente, de esgotamento, de perversão moral ...Apenas um super-homem, um homem não apenas inocente,mas o próprio Filho de Deus, de tanta grandeza moral, de tanto domínio de Si, de um coração tão grande que ama, desculpe e perdoa seus próprios carrascos e viscerais inimigos, enquanto eles estavam se cevando de seu sangue ...apenas Jesus Cristo podia apresentar, já morto, um rosto com tanta paz,tanta majestade, tão resignada aceitação da morte, tão serena beleza ... como aparece no Sudário"
Manuel Solé, O Sudário do Senhor, Ed.Loyola,São Paulo, 1993, p. 254

Querer provar a falsidade do sudário com argumentos desta espécie é, no mínimo, basear-se em atitudes a-científicas e ser um estudioso não de história mas de estórias. Tanto que alguns especialistas no sudário ironizam, dizendo que nem a maior inteligência do Renascimento, da qual temos conhecimento, ou seja, a de Leonardo da Vinci, poderia imaginar todos esses detalhes impressos no sudário. Mas, o que confunde ainda mais os que consideram o sudário uma fraude, um engodo, é ter que explicar como o “artista” soube utilizar o negativo de uma foto.
A descoberta dessa técnica, atribuída ao fotógrafo francês Daguerre, aconteceu somente em 1835, e só foi descoberta no sudário por ocasião das primeiras fotos, reveladas apenas em 1898. Já vimos – e alguns estudiosos também insistem – que o tecido passou por vários incêndios anteriores ao século 13. Portanto, as diferentes exposições ao calor intenso poderiam ter alterado a composição química e as conseqüentes analises das técnicas empregadas.
A problemática sobre a legitimidade ou a falsidade do lençol somente é defendida ou combatida porque, diante da pessoa misteriosamente retratada, a ciência e o homem comum têm que se pronunciar, seja como representantes da ciência, seja como seres religiosos: quem é o enigmático homem retratado no sudário? Seria um desconhecido malfeitor, alguém justiçado pelo poder político de Roma? Poderia ser o Cristo dos Evangelhos?
Conforme descrito acima, e sem transformá-lo naturalmente em um dogma de fé, na crença que a figura retratada seja a do Cristo torturado e morto, o sudário pode ser considerado verdadeiro e genuíno. Ou não, dependendo dos pontos de vista e convicções de cada um. O que intriga é a força que se irradia daquele misterioso e fascinante lençol, por dois mil anos conservado e venerado como a mais importante relíquia religiosa para os cristãos de todos os tempos.

Sepultura de Cristo e a Glória da Síndone de Jean Gaspard Baudoin (Nice 1590 - 1669)
"Retirado o divino corpo do Salvador da cruz por José de Arimatéia, Nicodemos e talvez São João e algum outro discípulo foi depositado sobre o longo lençol que Lhe serviria de mortalha. São Marcos, em seu Evangelho (15, 46), esclarece que José de Arimatéia, depois de obtida a licença para sepultar Jesus, comprou um pano de linho para envolvê-lo. Esse lençol, segundo o costume, era longo e deveria ser dobrado na altura da cabeça sobre o cadáver a ser sepultado.
Algumas faixas de tecido serviriam para prender o lençol ao longo do corpo. Não tiveram tempo para lavar o corpo, nem barbear o rosto, como era costume, pois já estava tarde e, com o pôr do sol, começaria o sábado, dia em que não se podia trabalhar; esse ritual, aliás, não se observava com sentenciados. Os discípulos puseram então algumas ervas aromáticas junto ao corpo ainda ensangüentado de Jesus, e O depositaram no sepulcro. Parecia tudo terminado, mas era exatamente o momento em que tudo começava..."
Plinio Maria Salomeo, escritor.
Procurem no Evangelho as referências ao Sudário.