As controvérsias penitenciais.
Você tem acompanhado meu esforço em fazer um Blog sobre a história da Igreja, todavia você não poderá dizer que eu sou um conhecedor da história eclesial. Muito menos poderá dizer que sou um historiador. No que tenho visto, nos textos que leio, é que podem ser classificados de duas maneiras básicas, os redigidos por amigos da Igreja, e os redigidos pelos inimigos da Igreja, ainda que no seio da Igreja. Uma segunda classificação dirá respeito à qualidade e densidade histórica dos textos, pois a grande maioria deles, como eu, repete por ouvir falar, não nos preocupamos de ir à busca de textos originais, cotejados entre os seus contemporâneos, para entender o uso correto dos termos e a pureza da mensagem registrada. Quase todos nos dizemos doutos num assunto que percorremos superficialmente.
Anos atrás montei em uma motocicleta e saindo de Curitiba foi parar no Canadá. É óbvio que vi e experimentei muita coisa nova, todavia quando digo: Conheço os países pelos quais passei, é possível que conheça mais do que aqueles que lá chegaram por avião, mas se for sincero falta muito, mas muito mesmo, para poder usar a palavra “Conheço”. O Paraná, onde nasci, ainda hoje me surpreendo, imaginem o resto desse imenso planeta.
Assim tem sido essa viagem que me propus a fazer nos caminhos da História da Igreja, de modo a ir relatando para vocês o que vou encontrando, sempre lembrando que duvidas maiores, por favor, recorram a quem entende da fé cristã, a Igreja de Pedro, guardiã inequívoca da verdade.
Livros ditos cristãos pretendem ao discutir a questão das discutições sobre a Penitência, nos induzir a acreditar que a Igreja divorciou-se do evangelho, e que o evangelho divorciou-se da Igreja, ambas as proposições são falsas.
Por exemplo, o autor diz: “Ate o século VI era concedido uma vez na vida o sacramento”, mais adiante o mesmo autor dirá: Tertuliano morto em 220; “ parece ter sido o primeiro” , a falar em pecados irremissíveis... E continua, porém, o Papa Calixto I (217-220) concedia a reconciliação a todo pecador que fizesse penitencia.
Algo de errado vai ai. Nós leremos em Mateus 18, 22 que Pedro perguntando a Senhor quantas vezes deveria perdoar o irmão arrependido, recebe do Senhor a resposta, setenta vezes sete (ou seja, muitas vezes). Ora os evangelhos foram escritos depois da morte de Jesus Cristo, portanto era pratica da comunidade cristã (Eclésia) o perdão, todavia não por todos os cristãos, mas por aqueles escolhidos como apóstolos por Jesus Cristo para ministrar os sacramentos, como lemos em João 20,22 e seguintes, momento histórico, pois estando os apóstolos reunidos, depois da ressurreição, num mesmo lugar, Jesus Cristo bafejou-o com seu hálito e disse-lhes “recebei o Espírito Santo a quem perdoareis os pecados estarão perdoados; e a quem o retiver, ser-lhes-ão retidos”. Ora estava instituído o Sacramento da Penitência, e um sacramento é o que santifica, torna sacro, santo, purifica. Mais adiante leremos algo que nos impressiona: desde que o Senhor conferiu aos sacerdotes o poder de reterem ou perdoarem os pecados, torna-se evidente que também os instituiu juízes dessa matéria.
O Senhor parece ter dado isso mesmo a entender, quando incumbiu os apóstolos de desprenderem das ataduras a que estava ainda ligado Lazaro ressuscitado dentre os mortos, como lemos João 11, 44. Santo Agostinho comentando essa passagem faz o seguinte comentário (o que não significa que a Igreja assim não procedesse como se deduz do Evangelho): “Os sacerdotes já podem prestar melhores serviços. Podem também usar de maior clemência com os confessados, a quem conferem o perdão das culpas. Sem duvida quando o Senhor pelos próprios apóstolos entregou Lazaro ressuscitado aos discípulos o desatassem queria demonstrar que o poder de desligar fora entregue aos sacerdotes, e foi nesse sentido que mandou aos leprosos se mostrarem aos sacerdotes e se submetessem ao seu julgamento em Lucas 17,14. Assim me parece imprudente pensar que um sacramento instituído pelo próprio Cristo não seja seguido de obrigatoriedade, portanto devem os fiéis estarem certos da necessidade de se penitenciarem através da Confissão, sem o que não podem recuperar a vida sobrenatural. Disso temos provas evidentes na belíssima metáfora usada por Nosso Senhor quando deu o nome de CHAVE DOS CÉUS, ao poder de administrar os sacramentos (Mateus 16,19). Ora como ninguém pode entrar num recinto de porta fechada, sem a intervenção de quem guarda as chaves: assim também não será admitida pessoa nenhuma no céu se as portas não lhe forem abertas pelos sacerdotes, a cuja discrição o senhor entregou as chaves. Tudo isso é Bíblico, embora os inimigos digam que foram truques para preservar o "poder da igreja", se foi um truque, foi um truque instituído pelo próprio Cristo para preservar o poder de seus apóstolos e discípulos reunidos em torno de Pedro. Nesse sentido, quando Santo Agostinho combate as heresias, e não define para a Igreja, ele dirá como muita propriedade:” Ninguém diga a si mesmo, de si para consigo: Faço penitência às ocultas, na presença do Senhor. Deus sabe o que me vai na alma, e dar-me-á o perdão. Seriam então infundadas aquelas palavras: O que desligares na terra será desligado também no céu? Será que as Chaves foram confiadas inutilmente, à Igreja de Deus?”(Agostinho Homilia 49, sermão 392).
Em 250, mais ou menos, surgia um Bispo chamado Novaciano, que não só queria que os apóstatas (num tempo de muitas perseguições e heresias, não voltassem a Igreja, como alguns pecados não lhes fossem perdoados como o homicídio e o adultério que o Papa Cornélio (251-253) havia regulamentado. Novaciano queria uma igreja diferente, e por isso rebatizava os cristãos que aderissem as suas teses. Foi condenado pela Igreja e excomungado, assim como também foi duramente combatido por São Cipriano de Cartago (África) e Dionísio de Alexandria (Egito). Se esse movimento era rigorista, em Cartago, surge outro laxista, isto frouxo, que queria o oposto, a reconciliação dos apóstatas sem a penitência sacramental, desde que fossem recomendados pelos célebres: “confessores da fé”, leigos com mérito, como querem hoje.