O Islamismo em um mundo de iletrados.
Gosto de voltar sempre a esse tema. Quando dizemos que o Islamismo desenvolveu-se em um mundo de iletrados, não há demérito nenhum, pois o cristianismo também se desenvolveu assim, e assim também se desenvolveu o povo hebreu.
Quando imaginamos as grandes construções egípcias, tendemos a acreditar que se tratava de um povo que dominava a escrita, mas não era assim. Pouquíssimos escribas e alguns sacerdotes escreviam, e raramente isso poderia ser considerado com critério literatura, pois as mais antigas escrituras eram guarda livros assinalando as economias e tesouros. Embora a escrita marque para sempre o inicio da História, ou seja, história e escrita são quase sinônimos, nem gregos, nem romanos tiveram um povo de letrados, e não ouviremos falar de uma tentativa de massificar a escrita antes do século oitavo depois de Cristo. Para se ter uma idéia, o livro mais antigo do Japão foi escrito em 900 depois de Cristo.
A escrita é filha da arte, e os primeiros escritos, não passavam de desenhos, entalhes na pedra, ou esculturas no barro. Os antigos sumerianos e sua escrita cuneiforme, que também não era de domínio publico não passavam de longas listas de comercio. As estrebarias de escribas dos Egito ensinavam os hieróglifos (gravuras sagradas) gravados em pedras. Nessa época, pelos anos 5000 antes de Cristo, os livros como o sumeriano Gilgamesh e a história dos faraós pesavam muitas toneladas cada um. Você não esperava que as crianças levassem para a escola, debaixo dos braços. “A Biblioteca” babilônio-sumeriana encontrada em Tellos continha trinta mil ” escritos” gravados em tijolos e parecem ter 5500 anos de idade. O Mahabharata dos hindus tem 7000 folhas escritas em um tipo de palma. O Zend Avesta dos persas foi escrito em 12 000 couros de vaca. Homero nos conta que os grandes poetas gregos eram cegos, portanto também eles não escreviam. O quadro dos iletrados, e dos poucos letrados, foi de um concretismo aterrador mesmo ao tempo de Cristo, e não foi diferente em 620 no inicio do Islamismo.
As assembléias de leitura (Ecclesiae) eram uma pratica nas sinagogas dos Judeus por esse mesmo motivo, os que liam, liam para os que não liam.
Ninguém carregava debaixo dos braços os muitos rolos de couro de Per gamo (o pergaminho), papiro (espécie de folha de palma), linho ou papel de trapo dos chineses, que continham as “anotações do velho testamento”, manuscritas, muito menos os rolos do Novo Testamento. O Al-Korão, tem hoje cerca de mil paginas, e isso significava um numero enorme de rolos de linho, escrito por poucos, em anos de trabalho, e lido por muito poucos privilegiados, como a história comprova, e a total ausência de eventos que tenham encontrados originais, concorrem para comprovar que as “tiragens” eram mínimas em todas essas religiões. A massificação da leitura só surgirá na história com Carlos Magno num esforço publico de alfabetização de todo um povo cristão.
Isso, essa realidade aterradora e desconcertante, não significava que esses povos eram “burros”, pois faziam cálculos surpreendentes, eram capazes de recitar versos de 600 estrofes, e fazer cálculos mentais de grande complexidade, tinham uma arquitetura primorosa, artes e ourivesaria primorosa, eram estrategistas habilidosos e astrônomos invejáveis. O aspecto pejorativo do analfabetismo é bem recente, e está bem ligada a origem de classes distinguidas pelo domínio da escrita, e não mais pelas artes da guerra, da musica, das artes plásticas, da dança e da magia ou da riqueza material ou poderio militar.
Nesse contexto de iletrados, por volta de 610/11 Maomé efetuou sua conversão. Profundamente impressionado pela desunião dos homens de seu povo, tornava-se cada vez mais introspectivo, meditativo e entregava-se a severas práticas de mortificação retirando-se com freqüência para o isolamento. Certa vez na Noite do Destino, contam-nos que teria tido uma visão onde um estranho personagem lhe ofereceu um rolo de pano coberto com caracteres e sinais e mandando-lhe que lesse. Maomé relutou, pois provavelmente fosse iletrado, mas ao acordar dessa visão estava ele convencido de que o livro descera ao seu coração. Percebia em si uma voz que lhe falava em nome de Deus atribuindo-lhe a missão de retomar as crenças antigas de seu povo e por termo a idolatria e as disputas religiosas de seus irmãos de sangue, indicando a todo o caminho da união. Muito perturbado foi socorrido nesse propósito pela sua esposa Khadija, que auxiliada pelo seu primo Veraka, homem letrado, que interpretou as mensagens do coração de Maomé apresentando-lhe assim: Deus te escolheu o profeta da nova fé. Todavia Maomé tornava-se cada vez mais assustado com as visões que tinha, chegando a pensar no suicídio, pois se julgava perseguido por espíritos, mas foi quando Veraka através de Khadija, lhe explicou que o Arcanjo Gabriel lha anunciava que seria ele Maomé, o apóstolo do Senhor.
Nascia um líder militar. Se você através das Imagens do Google se der ao trabalho de ver desde o espaço o que é a Arábia hoje, compreenderemos o que era a Arábia no passado. Uma atividade pesqueira no entorno do Mar Vermelho, uma atividade pastoril insipiente, uma agricultura em solo árido e difícil, restava aquele povo explorar os segredos do deserto em caravanas comerciais ou guerreiras.
Ao tempo de Maomé, no comando de guerreiros, quando as tropas voltavam pela metade, haveremos de compreender a poligamia, pois os homens precisavam de filhos, a o grande numero de viúvas e órfãos precisavam de sustento. Assim o Islam foi se moldando as necessidades de suas próprias circunstancias. Conta-se que Maomé chegou a possuir seis mulheres, sendo a mais nova com apenas seis anos. Não, Maomé não era pedófilo, e suas mulheres adultas e concubinas certamente lhe satisfaziam qualquer apetite carnal, mas não era esse o significado pratico da poligamia, muitas vezes ela significava a união de tribos inteiras, de famílias tradicionalmente inimigas, às vezes significava o fortalecimento dos rebanhos, dos guerreiros, dos cavalos, das armas e das riquezas. Muitos povos se utilizaram das uniões conjugais para o fortalecimento político ou militar. Também para o crescimento intelectual.